Impressões da Visita ad limina
1. Alguns pontos do programa
De 5 a 12 de setembro os bispos portugueses estiveram em Roma, convocados pelo Papa Francisco para realizar a visita periódica ao túmulo dos apóstolos Pedro e Paulo e ao sucessor de Pedro, designada em latim por visita ad limina Apostolorum, a fim de aprofundar a comunhão fraterna e colegial com ele e entre si. O diretório dos bispos diz que esta visita se deve realizar, se possível, de cinco em cinco anos. Mas, com o aumento do número de bispos no mundo, devido à criação de novas dioceses e a longevidade crescente, a periodicidade tem vindo a dilatar-se.Nesta visita há muitos momentos de oração, de diálogo com o Papa e seus colaboradores nas várias congregações, conselhos pontifícios e comissões, com um programa muito preenchido e cansativo, sobretudo para os presidentes das comissões episcopais, que têm de fazer uma apresentação e breve relatório sobre a situação da Igreja em Portugal no respetivo setor, para além dos relatórios enviados cerca de meio ano antes por cada bispo acerca da sua diocese e serviço.
O primeiro dia foi de convívio e viagem de estudo da história do papado, sobretudo em relação aos anos que precederam o assim denominado exílio de Avinhão. Fomos a Anagni, uma terra a sul de Roma, onde residiram alguns papas, sendo o mais conhecido Bonifácio VIII, o último a defender a primazia do poder espiritual e temporal do papado contra as pretensões absolutistas dos imperadores da Alemanha e da França.
Visitar a catedral de Anagni, da sua cripta, a que podemos chamar a primeira capela sixtina, assim como o palácio de Bonifácio VIII, foi refrescar a memória dum período importante da história da Igreja. O almoço em Fumoni, onde o Papa S. Celestino V passou os últimos meses de vida após a sua resignação, em 1294, a última antes de Bento XVI, projetou-nos para épocas históricas muito distantes no tempo e na mentalidade, mas com alguns acontecimentos similares, embora com causas e interpretações diferentes.
No dia 7, às 7,30 horas da manhã já nos encontrávamos a celebrar a Eucaristia com Laudes na cripta dos Papas, diante do túmulo de S. Pedro, para, logo a seguir, o primeiro grupo, de que fiz parte, se encontrar com o Papa Francisco na biblioteca pontifícia. Depois da saudação e apresentação pessoal de cada bispo, começou um diálogo ameno e profundo dos bispos com o Papa, sobre as mais variadas questões, como a catequese e iniciação cristã, o problema dos imigrantes, etc.
Sem entrar em pormenores, notou-se a mudança em curso, do centralismo de Roma para a corresponsabilização dos bispos nas suas dioceses e países, embora sempre em comunhão colegial entre si e com o Papa, sucessor de Pedro.
Notou-se também o início do ano nos serviços da Cúria romana, após um período de férias. O verão em Roma é quente e húmido. Por isso muitos saem de lá e vão de férias. Também os Papas anteriores costumavam sair para as montanhas e para Castelgandolfo, nas imediações de Roma, uma colina alta, de clima ameno. O Papa Francisco tem ficado no Vaticano, com pena dos comerciantes desses locais de férias, que têm perdido muitos clientes e parecem descontentes com esta situação.
2. Mudanças de estilo
Sendo esta a minha terceira visita, depois de 1999 com S. João Paulo II e 2007 com Bento XVI, pareceu-me ter sido a melhor e com maior participação de bispos eméritos, praticamente todos, como também ouvi dizer a outros colegas. Talvez a popularidade do Papa Francisco tenha sido um chamariz.
Notei que o Papa e os seus colaboradores mostram um grande apreço pela corresponsabilidade dos bispos nas suas respetivas dioceses e países, estando a esvaziar o centralismo de Roma. Sinal disso foi a promulgação, durante a nossa visita, do Motu próprio Mitis iudex (juiz misericordioso) sobre os processos de nulidade do matrimónio. Os bispos de cada país, em princípio, conhecem melhor a sua realidade cultural e eclesial e poderão discernir com maior proximidade e justeza a verdade do compromisso matrimonial, mantendo o princípio da indissolubilidade do matrimónio cristão. O mesmo acontece noutras áreas, sem negar a ortodoxia da fé cristã.
Um outro benefício deste encontro com o Papa e os seus serviços é proporcionar aos bispos mais tempo para estarem juntos, para rezar, refletir e dialogar sobre o seu ministério, com suas alegrias e dificuldades, daí resultando um aprofundamento da sua comunhão e compreensão mútua. Jesus enviou os apóstolos dois a dois, em missão. A comunidade é sempre importante e benéfica para o exercício da vida apostólica. Embora nos reunamos várias vezes por ano, em assembleias plenárias, retiro, jornadas e comissões, no entanto, longe dos nossos ambientes de residência e de trabalho, embora tendo sempre presentes os afazeres do nosso ministério, enquanto a mente descansa, o coração aquece, para assumir com novo entusiasmo, novo ardor e linguagens mais adequadas a missão evangelizadora.
Desta vez a Visita ad limina aconteceu no início do ano pastoral. Na diocese de Beja preparamo-nos para viver o último ano do sínodo, também ano jubilar da misericórdia, da visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima, em preparação do primeiro centenário das aparições, à qual quero consagrar o meu último ano à frente desta diocese.
† António Vitalino, bispo de Beja
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